O protocolo de uso da profilaxia primária em caso de hemofilia grave
Redação
A profilaxia primária da hemofilia consiste na infusão de concentrado de fator VIII (para hemofilia A) ou fator IX (para hemofilia B) antes da ocorrência de sangramentos.

A profilaxia primária (PP) em hemofilia é um tratamento profilático realizado para pacientes com hemofilia A ou B grave, independentemente da ocorrência de sangramentos. É recomendada para ser iniciada antes da segunda hemartrose e deve ser mantida por tempo prolongado, idealmente até a adolescência.
A PP é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde e pela Federação Mundial de Hemofilia como o tratamento de escolha para a forma grave da hemofilia. Dessa forma, a profilaxia primária consiste na infusão de concentrado de fator VIII (para hemofilia A) ou fator IX (para hemofilia B) antes da ocorrência de sangramentos.
O tratamento deve ser iniciado imediatamente após a primeira hemartrose ou hemorragia grave e antes dos 3 anos de idade. A frequência das infusões varia de 1 a 3 vezes por semana, dependendo do tipo de hemofilia e da resposta do paciente.
As principais vantagens incluem a prevenção de complicações musculares e articulares da hemofilia, que podem levar a deformidades físicas; a redução de outros sangramentos; e a melhora na qualidade de vida dos pacientes, permitindo maior participação em atividades físicas e sociais.
Somente pacientes com hemofilia A ou B grave (com dosagem de fator inferior a 2%) e com idade inferior a 3 anos podem participar da profilaxia primária. Os pacientes com inibidores ou que não respondem ao tratamento não devem ser incluídos.
O acompanhamento médico é fundamental, com avaliações periódicas e testes de dosagem do inibidor. O paciente deve manter um registro das infusões e retornar ao centro de tratamento de hemofilia para descarte adequado de materiais utilizados. Os riscos incluem a possibilidade de desenvolvimento de inibidores, reações alérgicas e a necessidade de cateter venoso central devido à frequência das infusões.
Conforme o MS-PCDT: Profilaxia primária em caso de Hemofilia Grave (Protocolo de Uso) de 2025, a hemofilia é uma doença hemorrágica, de herança genética ligada ao cromossomo X. Ela se caracteriza pela deficiência do fator da coagulação VIII (hemofilia A) ou do fator da coagulação IX (hemofilia B). As hemofilias A e B ocorrem em cerca de 1:10.000 e 1:40.000 nascimentos de crianças do sexo masculino, respectivamente, não apresentando variação racial ou étnica.
Do ponto de vista clínico, as hemofilias A e B são semelhantes. O diagnóstico diferencial entre elas é feito por exames laboratoriais de dosagens específicas da atividade de fator VIII e de fator IX. A hemofilia é classificada de acordo com o nível plasmático de atividade coagulante do fator deficiente, podendo ser leve [quando os níveis de atividade do fator são de 5% a 40% (equivalente a > 0,05 a 0,40 UI/ml)], moderada [nível de atividade de fator de 1% a 5% (ou 0,01 a 0,05 UI/ml)] ou grave [nível de atividade de fator inferior a 1% (ou < 0,01 UI/ml)].
A manifestação clínica mais frequente nos pacientes com hemofilia grave são as hemorragias músculo-esqueléticas, principalmente as hemartroses. Hemartroses de repetição em uma mesma articulação (articulação-alvo) podem levar à degeneração articular progressiva, denominada artropatia hemofílica.
A prevenção ou o tratamento das hemartroses e outros episódios hemorrágicos observados nos casos de hemofilia envolvem a infusão intravenosa do fator de coagulação deficiente, que pode ser feita em ambiente hospitalar, ambulatorial ou domiciliar. Atualmente, existem duas modalidades de tratamento com concentrado de fatores de coagulação: tratamento sob demanda e o tratamento profilático. O tratamento sob demanda, ou episódico, refere-se à infusão do concentrado do fator de coagulação após o episódio hemorrágico. Neste caso, a reposição deve ser repetida diariamente até que os sinais e sintomas cessem.
O tratamento profilático se subdivide em três modalidades; a profilaxia primária: profilaxia contínua e regular iniciada na ausência de doença articular documentada, determinada pelo exame físico ou exames de imagem e antes do segundo sangramento articular clinicamente evidente e dos 3 anos de idade; a profilaxia secundária: profilaxia contínua e regular iniciada após dois ou mais sangramentos articulares, mas antes do início da doença articular, em caso de pacientes com 3 ou mais anos de idade; e a profilaxia terciária: profilaxia contínua e regular iniciada após o início da doença articular documentada, constituindo-se normalmente na profilaxia iniciada na idade adulta.
A profilaxia primária vem sendo utilizada em países desenvolvidos desde a década de 1960. Inexiste consenso na literatura com relação a alguns aspectos do tratamento e, por isso, diferentes esquemas são utilizados.
Os principais pontos de divergência são o número de doses e de unidades de concentrado de fator VIII ou IX utilizados e os intervalos entre as doses; a idade de início da profilaxia primária; a idade de suspensão dessa profilaxia; e o acesso venoso. Idealmente, recomenda-se que a profilaxia primária seja iniciada no caso dos pacientes com hemofilia grave precocemente durante a infância, na ausência de doença articular, antes da segunda hemartrose e antes dos 3 anos de idade.
O início da profilaxia após a segunda hematrose é justificado pela baixa frequência dessa manifestação (10%-15%) em alguns pacientes com hemofilia grave. Assim, em uma parte dos pacientes, a profilaxia pode ser iniciada mais tarde. A profilaxia secundária, iniciada após dois ou mais episódios de hemartrose, porém antes do início da doença articular, também é eficiente na redução das hemorragias e hospitalização e na melhora da qualidade de vida.